Como funciona a estimulação magnética transcraniana no tratamento da depressão refratária?
Autor: Joel Lamoure
Pergunta
A estimulação magnética transcraniana (EMT) parece ser um tratamento viável para pacientes com distúrbios depressivos maiores que são resistentes ao tratamento. Qual é o mecanismo farmacológico da EMT?
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Resposta de Joel Lamoure, RPh, BSP, FASCP
Professor adjunto, Departamento de Psiquiatria, University of Western Ontario, London, Ontário, Canadá; farmacêutico da área de saúde, London Health Sciences Centre, London, Ontário, Canadá |
A estimulação magnética transcraniana (EMT) é uma técnica não invasiva que utiliza campos magnéticos para induzir correntes elétricas fracas no tecido cerebral. Como resultado, os neurônios podem ser estimulados sem eletrodos externos. Uma bobina de metal é colocada próximo à cabeça da pessoa ou animal sobre parte do cérebro, como o córtex pré-frontal dorsolateral. 1
Essa técnica pode ser classificada em diferentes tipos. O foco deste artigo será a EMTr, na qual o “r” representa um ciclo repetitivo. Existem dois subtipos diferentes de EMTr: alta freqüência, definido como o uso de aplicações ao córtex pré-frontal esquerdo de 3 a 20 hz, e baixa freqüência, definido como o uso de 1 hz ou menos aplicado ao córtex pré-frontal direito. 2
A depressão unipolar pura é definida na literatura com uma incidência de 1,5% a 19%. 3 Apesar das opções de tratamento que incluem medicações para retomar a regulação de neurotransmissores no cérebro (por exemplo, serotonina, dopamina, monoaminas e norepinefrina) e intervenções comportamentais (por exemplo, terapia cognitiva comportamental), existem várias falhas de tratamentos, secundários aos efeitos colaterais, com relação à acessibilidade, à adesão ao medicamento ou ao início de sua ação. 3
A incidência estimada de depressão refratária ao tratamento aumenta com o número de episódios do paciente. Por exemplo, a taxa de recuperação (remissão prolongada) em pacientes tratados, com somente um episódio depressivo maior, é de 50%, enquanto os pacientes que sofreram três episódios apresentam recorrência de seus sintomas cerca de 90% das vezes. 4 Quando consideramos a qualidade de vida e morbidade do paciente, se a remissão dos sintomas não é alcançada inicialmente com o tratamento, 67,6% dos pacientes terão reincidência dentro de dois anos versus 15,2% dos pacientes que apresentaram remissão dos sintomas inicialmente. 4
Nestes pacientes com depressão refratária ao tratamento, devem ser consideradas opções como a terapia eletroconvulsiva. Apesar de a terapia eletroconvulsiva quinzenal ter um período de latência menor do que a EMTr, esse procedimento necessita de anestesiologia e é associado à perda de memória (secundária à crise convulsiva como uma variável) e apresenta risco real de convulsão. 3 Sendo assim, é importante determinar se o paciente está utilizando algum medicamento que possa interferir no risco de convulsão, o que pode levar a complicações e representar um desafio.
Uma análise da literatura de maio de 2003 aos dias de hoje reuniu 14 estudos sobre EMTr. No entanto, alguns desses estudos incluíam grupos tratados com farmacoterapia, o que pode representar um fator confundidor à eficácia da monoterapia com EMTr. Gershon e colaboradores 2 conduziram uma análise da literatura na qual a intervenção farmacoterápica foi removida, encontrando quatro em dez pacientes parcial ou totalmente responsivos à EMTr versus não responsivos no grupo controle. No grupo controle, similar a um grupo placebo, a bobina magnética é protegida para minimizar a quantidade de emissões magnéticas.
Esses números conferem com outro grupo não tratado com fármacos no qual George e colaboradores 5 identificaram um número significativamente maior de pacientes responsivos à EMTr (9 em 20) do que no grupo placebo (0 em 20), com P < 0,01, garantindo significância estatística. O tratamento foi realizado todo dia durante duas semanas.
Com essa evidência, a questão revista torna-se qual é o impacto da EMTr no cérebro? A resposta é de que há alterações no córtex pré-frontal e na atividade paralímbica, mesmo após duas semanas de tratamento com EMTr, semelhante ao estudo conduzido por George e colaboradores.
Em outro estudo, Teneback e colaboradores 6 identificaram atividade aumentada no giro cingulado e aumento de fluxo sangüíneo paralímbico após duas semanas de tratamento. Esse achado é importante já que o efeito do cingulado foi demonstrado ser fraco entre os pacientes depressivos; de maneira intrigante, antidepressivos, como fluoxetina, demonstraram aumentar a atividade do giro cingulado. 6 Os pesquisadores teorizaram que os pacientes que responderam ao EMTr apresentaram aumento da atividade frontal inferior, o que serviria como indicador da resposta à EMTr. 6
Do ponto de vista da neurotransmissão, EMTr apresentou um impacto na modulação positiva dos receptores beta-adrenérgicos no córtex frontal, na modulação negativa dos receptores de serotonina (5-HT 2 ) no córtex frontal e nos níveis de monoamina. 7,8 Assim, parece haver alterações na fisiologia e neuroquímica cerebrais que são únicas no tratamento com EMTr. 7
Do ponto de vista da segurança, a EMTr foi originalmente elaborada para ser, de uma maneira geral, bem tolerada. Entretanto, foram identificados efeitos colaterais leves, incluindo ligeiro desconforto devido ao espasmo muscular facial (14%) e cefaléia leve a moderada (9%), em comparação com grupos-placebo que não apresentaram efeitos colaterais. 9 O tratamento desses efeitos inclui: redução da intensidade estimulatória em 10% para os espasmos faciais e analgésicos, se tolerados, para as cefaléias. 9 Ao contrário do observado com a terapia eletroconvulsiva, não foram observados comprometimento da memória, problemas de concentração ou alterações cognitivas. 9
Referências bibliográficas
- O'Reardon JP, Solvason HB, Janicak PG, et al. Efficacy and safety of transcraniana magnetic stimulation in the acute treatment of major depression: a multisite randomized controlled trial. Biol Psychiatry. 2007;62:1208-1216. Resumo
- Gershon AA, Dannon PN, Grunhaus L. Transcraniana magnetic stimulation in the treatment of depression. Am J Psychiatry. 2003;160:835-845. Resumo
- Menkes DL, Bodnar P, Ballesteros RA, Swenson MR. Right frontal lobe slow frequency repetitive transcraniana magnetic stimulation (SF r-TMS) is an effective treatment for depression: a case-control pilot study of safety and efficacy. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 1999;67:113-115. Resumo
- MacQueen G. Neurobiology of depression: a complex disorder. Presented in London , Ontario , January 16, 2008 .
- George MS, Nahas Z, Molloy M, et al. A controlled trial of daily left prefrontal cortex TMS for treating depression. Biol Psychiatry. 2000;48:962-970. Resumo
- Teneback CC, Nahas Z, Speer AM, et al. Changes in prefrontal cortex and paralimbic activity in depression following two weeks of daily left prefrontal TMS. Neuropsychiatry Clin Neurosci. 1999;11:426-435.
- Ben-Shachar D, Gazawi H, Riboyad-Levin J, Klein E. Chronic repetitive transcraniana magnetic stimulation alters beta-adrenergic and 5-HT2 receptor characteristics in rat brain. Brain Res. 1999;816:78-83. Abstract
- Ben-Shachar D, Belmaker RH, Grisaru N, Klein E. Transcraniana magnetic stimulation induces alterations in brain monoamines. J Neural Transm. 1997;104:191-197. Abstract
- Klein E, Kreinin I, Chistyakov A, et al. Therapeutic efficacy of right prefrontal slow repetitive transcraniana magnetic stimulation in major depression. Arch Gen Psychiatry. 1999;56:315-320. Resumo
Informação sobre o autor: Joel Lamoure, RPh, BSP, FASCP, professor adjunto, Departamento de Psiquiatria, University of Western Ontario, London, Ontário, Canadá; farmacêutico da área de saúde mental, London Health Sciences Centre, London, Ontário, Canadá. Declaração de conflito de interesses: O autor declara ter recebido patrocínio para pesquisa da Eli Lilly do Canadá e Purdue Pharma Canadá, além de ter sido consultor da Pfizer Canadá.
http://www.medcenter.com/Medscape/content.aspx?LangType=1046&menu_id=609&id=8470